terça-feira, 12 de março de 2024

menina dança

A menina dança

Integrar o canto, o cisco e o olho
Achar a dança
Integrar as partes 
Condoídas
As feras feridas
Os olhos fechados
O movimento
Integrar a menina
Até o sol raiar
Até parir a menina
Que já não brinca
Que já não dança
Que já não há

garota material

Material girl

As garotas de plástico 
Surgiram como um engodo
Vomitei nelas meu sumo rosa
Fiz delas vudus modernos
Desses que só o fogo transforma
Triturei sem piedade
No fim, a mim mesma
Elas idolatrei
Como aos ídolos modernos
Que só nas telas
Que só no fogo
Pode transformar

era perdida

Uma era perdida
Que era futuro
E ficou no âmago 
Do passado
Uma era das flores
Onde os amores
Antepassados
Uma era de paz
Onde só jazz
No passado

Quero reinaugurar 
Sem cascas 
Essas máscaras
Na mudez das plantas
Na nudez antas
Pelo mato

Tirar por fim o sapato
E pisar no presente
Chão quente
De então

é sobre isso

Sim, garota
É sobre isso
Nas costas do vento
Feito raio ou nuvem
Nas encostas do tempo
De arenito
No mármore dos céus
Na casa de Deus
É sobre isso
Os caminhos sem pontes
A areia movediça 
O cavalo branco perdido
Andando em círculos 
Na neblina
Esperando com chuva
O milagre molhado
Na paisagem cinza

busto

Um busto,
Uma estatueta
Um busto
Peito e rosto
Robusto
Um busto
Um prêmio 
Uma coisa

revoa

Meu pensamento revoa
Os olhos que não são meus
No breu divagam
Pensamento sonâmbulo
Recortou
Na figura descampada
Sem brilho familiar

virgem

Santa virgem
Viril imagem
Vejo

Algo do desejo
Alga do mar
Algo feito beijo
Desrespirar

Cabeça coroa
De rainha
Do mar

Cabaça aludir
Luzir, criar

Cria do desejo
Ensejo 
Me dar

soslaia

De soslaio
No marasmo
Do narcisismo

Na fazenda
Astral
No abismo

Não me siga
Que não sou
Novela

Diz ela

Mas o drama
É presente
Interino

Água do ventre 
Que reprimo

saturnina

Saturnina
Na miséria de si
Poeira do tempo
Cisco incômodo 
Nos olhos da Deusa

Dispersa
Na diáspora feminina
Distorção  nuclear
A célula mãe
Está em pauta
A alegria 
do encontro 
desapegado
Onde a água flui
Feito vento
Vaporosa

Criança que brinca
E não se preocupa
Com a besteira
do mundo
A ovelha perdida
Na cabeça do Cristo
Aquela que se esgueira
 nos vales e montes
Entre as pedras
Buscando a si
Não nos rebanhos 
Mas nos resguardo
Nas arestas da alma
Onde apita a complexidade
E se desfaz em simples
O Mistério

crucificadas

Crucificadas
Todas as vezes
Que esse olhar hostil
Nos atravessa
Cheio de espadas
Cheio de cruz
Martírio
Delírio

Sanidade hipócrita 
Dos homens de bem
Aberração 
Do espelho distorcido
Tecido vivo
A pele que habito
Simulacro que cala
Verso afanado
Pelo inverso
Perverso
Pervertido
Janela vesga
Mão que se toca
Na toca da coelha
Loba, onça, pintada
Galinha dangola
Guiné da selva
Só viva, ela
Cósmica gosma
Sumo humano
Feminino santo
Profanação 
Uma nação fêmea 
Que sangra e não
Que pari e não
Mas sim
Uma fenda 
Senda cósmica